terça-feira, 18 de outubro de 2011

Varanasi–Ghats e cremacao

Tourist Information

VARANASI – GHATS

Cotação ghats : lllll

Quem vai a Varanasi fica sempre na expectativa de visitar os gaths do Rio Ganges. O que é um lugar para adoração e ritos sagrados, virou a maior atração turística da cidade. Não é exagero dizer que os gaths (escadarias) estão entre as grandes Mecas do turismo mundial. Há vários gaths em Varanasi, o número é incerto, nosso guia em Varanasi nos informou que são 82, outras fontes citam 100 ghats.

Os ghats são escadarias que descem em direção às margens do rio Ganges. São locais onde os hinduístas prestam seus ritos ao rio, cujas águas são consideradas sagradas; e também local onde são realizadas as cremações a lenha.  O rio Ganges é considerado também o mais poluído do mundo.

Os degraus foram construídos em função do regime das enchentes do rio. Quando o rio está alto, usam se os degraus superiores dos ghats e nas épocas de seca, com o rio baixo, os fiéis se acomodam nos degraus inferiores. Ou seja, cada degrau serve para determinado nível do Ganges.

Hinduístas de todo mundo vão aos ghats se banhar nas poluídas águas do Ganges, acreditam que se purificam dessa forma. Purificar é tirar todos os males do corpo e da alma, os maus fluidos e espíritos. Nosso guia garantiu que a fé proteje os fiéis contra as possíveis infecções pelas águas poluídas. Acredito nisso, sem a proteção da fé teríamos com certeza uma epidemia  gigantesca assolando o país inteiro.

Aos arredores dos ghats encontram-se vários comerciantes e camelôs vendendo artigos para rituais (velas, incenso, flores, etc), alguns vendem frascos de plástico para fiéis que desejam levar água sagrada para casa. O mais estranho (para nós) são os vendedores de lenha para cremação. A lenha é vendida por quilo e são necessários 200 a 300 kg de lenha por cremação (depende do tamanho do falecido...). Em alguns ghats existem serviços de cremação a gás, mas não são muito procurados.

Os ghats mais famosos são Dashashwamedh Ghat e Manikarnika Ghat.

O melhor horário para visita aos ghats é a tarde, quando ocorrem as cremações, e os ghats estão apinhados de fiéis se banhando. O acesso aos principais ghats é feito somente a pé (requer um guia) ou de riquixá. Tuc-tucs e veículos não entram nestes ghats devido ao grande movimento de pessoas, e às ruas serem muito estreitas e obstruídas por... vacas.

Fui duas vezes ao  Dashashwamedh. A segunda vez, a tardezinha, foi de riquixá e a pé. Foi uma aventura tenebrosa...

Varanasi-hinduistas se banham no Ganges

Hindustas se banham nas águas sagradas e poluidíssimas do rio Ganges.

Narrativa

Nossa ida ao Dashashwamedh Ghat, de madrugada

Cotação visita aos ghats e river tour : lllll

Fomos de manhã ao Dashashwamedh Ghat. O nosso guia e motorista nos explicou que era permitido o transito de carros apenas até as 8:00 e o local durante o dia seria intransitável mesmo para riquixás. Por isso, veio nos pegar no hotel as 5:00. Seguimos de madrugada pelas ruas de Varanasi. Incrívelmente chegamos a pegar congestionamento de caminhões e automóveis a essa hora do dia, nas proximidades do ghat. O carro estacionou numa rua e seguimos alguns quarteirões a pé. Eram 5:30 e ficamos abismados com o movimento nas ruas a esta hora. Muitos mendigos e moradores de rua já estavam acordados. Ambulantes chegavam para tomar posse de seus lugares. Chegamos a um ghat, não era o Dashashwamedh Ghat, e ali pudemos ver alguns fiéis chegando de madrugada para se banhar. Guia nos afirma que são madrugadores que querem, como nós, evitar a multidão; e também pessoas que se benzem no rio antes de bater o cartão no emprego.

Pegamos um barco e navegamos pelo Ganges. Esses barcos são feitos para turistas e já havia vários deles (todos europeus) embarcados, esperando a partida. O barqueiro inicia o tour,  a remo, todos barcos são a remo. O barulho de motores seria muito desrespeitoso para a santidade do lugar. Mas também o trabalho de barqueiro aqui é restrito a uma casta (os Mallahs) e eles preservam essa tradição de remar.  Passamos por vários ghats com algumas pessoas se banhando, até chegar ao Dashashwamedh Ghat, um dos locais de cremação. Não desembarcamos ali, acredito que não era permitido. Algumas famílias estavam ali recolhendo cinzas, não havia mais nenhuma pira, apenas cinzas e fumaça.

Retornamos, desembarcamos. Fiquei um pouco decepcionado, esperava ver as cremações em andamento, e mais banhistas. E também por que a luz da madrugada e o movimento do barco não permitiu boas fotografias. Mas, valeu muito a pena.

Decidi que retornaria ao Dashashwamedh Ghat a tarde, mas por terra, não embarcado. O guia nos deu um chapéu (migué), acho que ele teve preguiça de nos conduzir ao ghat a tarde, e  a pé. Também pode ser que já tinha outros compromissos agendados no decorrer do dia.

Varanasi-5h30m da manha-na beira de um Gath_

5:30 da manhã. Eu e Solange num ghat. Atrás de nós, um sem-teto ainda dorme. A direita, uma mulher com um lindo sari verde.

Varanasi- Solange no barco - river  tour Rio Ganges

Solange no river tour. A caminho do Dashashwamedt Ghat.

Tourist information

VARANASI – CREMAÇÃO

Não é objetivo deste blog filosofar sobre o tema, mas vai aqui uma rápida visão. Para quem pretende um dia visitar Varanasi, vale a pena a leitura.

A cremação é praticada por todas as principais religiões da India, Hinduísmo, Jainismo, Sikhismo e Budismo.

De acordo com a filosofia hinduísta o corpo humano é uma combinação de cinco elementos : fogo, água, ar, terra e o infinito. A cremação é o rito que leva ao último elemento, o infinito. Também há a crença de que a cremação é forma da alma deixar o corpo, de desencarnar.

Antes da cremação, o corpo é banhado no Ganges, e em seguida deixado para secar por alguns minutos. Todo o trabalho de cremação é reservado à uma sub-casta, chamada dom. Os doms são intocáveis, considerados de casta inferior. Na India (e também no Japão) trabalhar com cadáveres é considerado profissão impura, vergonhosa,  reservada às pessoas de baixo nível. Puro preconceito.

Até a metade do século XIX era praticado, por algumas tribos e sociedades indianas, um ritual chamado sati (ou suttee). Nele a viúva era induzida ou voluntariamente praticava suicídio, numa espécie de auto-imolação. Após o suicídio, era cremada junto com o marido falecido. No entanto, há relatos de auto-imolação jogando-se na pira de cremação do marido falecido. Na sociedade indiana não havia lugar para viúvas, elas tinham dependência total ao marido, e quando este falecia elas tornavam-se um estorvo para todos, e era abandonada e condenada a esmolar. A prática do sati foi banida pelos ingleses.

Segundo um guia me informou, sacerdotes, crianças menores de 2 anos, mulheres grávidas, leprosos e pessoas que falecerem com picada de cobra não são cremadas. São pessoas que já alcançaram o infinito. Suicidas e assassinos também não são cremados, são considerados indignos do ritual. Todos são enterrados. Alguns são jogados ao fundo do rio Ganges (ou outro rio sagrado) com pedras amarradas para não flutuar. A imagem de corpos flutuando no Ganges não é regra, é raro isso acontecer.

Os homens mais velhos são cremados envolvidos em manto vermelho, os mais jovens em manto laranja, e as mulheres em manto branco. Após a cremação, as cinzas são atiradas ao Ganges. Algumas mulheres são cremadas com suas joias, de forma que junto com as cinzas vão se o que restou dos colares, aneis, pulseiras, etc.  Alguns intocáveis (da casta dom) peneiram estas cinzas, em busca de ouro derretido, pequenas pedras preciosas, etc., numa espécie de garimpo surrealista.

Os corpo chegam aos ghats carregados em pranchas rústicas, artesanais, feitas de bambu. As famílias mais ricas alugam carros para levar o corpo apenas até as proximidades do ghat escolhido para cremação, pois os carros não chegam até aos ghats. São então carregados pelos parentes e amigos em cortejo fúnebre. Entretanto, as famílias pobres, não tendo dinheiro para alugar o rabecão, carregam o falecido até o local a pé, desfilando pelas movimentadas avenidas de Varanasi. Nós vimos um cortejo desses, foi um momento chocante ver o falecido desfilando pela multidão. Passamos também por um hospital e o guia nos mostrou uma loja que vendia artigos para funerais, várias pranchas de bambu estavam expostas em frente à loja. O guia nos explicou que essas lojas existem também próximo aos IMLs.

As fotos de cremação são consideradas profanas, por isso não tirei nenhuma. Somente os familiares podem tirar fotos da cerimônia. Antes do início do fogo, a família se reune atrás da cabeça do falecido e tiram fotos. Cabe ao filho mais velho a tarefa de iniciar a fogueira. Na ausencia deste, o irmão mais velho do falecido. E assim por diante, há uma hierarquia.

Quando voce chega ao local da cremação e vê toda aquelas fogueiras ardendo, tem um choque enorme. É uma experiência fantástica. No entanto, não demora muito e voce vai entender que se trata de um rito de passagem – ao que voce deve prestar profundo respeito. Nós, brasileiros, velamos e enterramos. Os indianos cremam e jogam as cinzas ao rio. São maneiras diferentes de se despedir de um ente querido. Apenas isso e nada mais.

 

Varanasi funeral - fonte Flickr - Proxy Indian

Um cortejo funeral segue carregando o falecido num prancha de bambu, pelas avenidas de Varanasi. Fonte: Flickr – Proxy Indian album.

Varanasi-Vendedor de lenha para cremação_2048x1536

Um depósito de lenha para cremação. A lenha é vendida por quilo. No primeiro plano, a balança.

Muito provavelmente o comércio de lenha é reservada à alguma sub-casta.

 

Como cheguei ao Dashashwamedh Ghat

 

Resolvi sair do hotel e ir até ao Dashashwamedth, a tarde. Pensei em pegar um tuk-tuk, mas um riquixa-man me informou que os tuk-tuks não chegam perto dos ghats. E verdade, devido ao transito, quantidade de pedestres, largura das ruas, etc, os tuk-tuks (e demais veiculos) não chegam aos arredores deste ghat.  Por isso contratei o riquixá-man. O bendito do riquixá man me disse que a viagem levaria 1 hora, mas durou 90 minutos ! Quando chegamos a uma determinada altura da viagem, ele parou num estacionamento de riquixas e disse que tinhamos que continuar a pé, por que daquele ponto adiante nem riquixá entrava nas ruelas. Era pura verdade, as ruas tinham de 2,00 a 3,00 metros de largura, e algumas vacas vagavam por ali, atravancando tudo. Na verdade, os derredores do Dashashwamedt era uma grande favela. Entramos nela, com o guia me levando e os habitantes do lugar nos mirando com um olhar espantado (“o que esse japones faz por aqui, perdido ?). Andamos por uns 40 minutos, até chegar as margens do Ganges.

Por isso, se voce quiser visitar um Ghat, procure se informar bem como chegar até lá, e planeje bem os horarios.

 

Se voce quiser ler um conto, de como cheguei ao Dashashwamedth, clique abaixo :

 

“Como cheguei ao gath Dashashwamedth”

 

Varanasi-6horas da manhaVaranasi-barco com turistas

DSC01892-Varanasi-

Solange deposita uma vela flutuante no Ganges, em memória aos mortos ali cremados. No barco, somente turistas, na maioria europeus.

 

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